E o Barquinho Vai… - Crônica “Estado de Minas" - 15/10/2015

Como corrupto que é, ele sabe que suas ações implicam em profissionalismo, dissimulação e cara-de-pau para aprontar trambiques, prática usual no país para operacionalizar uma série de procedimentos sob a capa de legalidade.

Na verdade não imaginava que obteria sucesso tão espetacular a ponto de ser qualificado, como em outros tempos, de finório, que o dicionário define como aquele que, aparentando ingenuidade, se vale de astúcia enganosa; espertalhão, ladino, sagaz.

Sua técnica refinada ao longo da vida tem lhe garantido grande sucesso em suas tramas.

Outro dia chegou a receber homenagem de amigos que conquistou ao longo de sua longa e vitoriosa carreira. Coube a ele – e não poderia ser de outra forma - os custos da festança, apesar da fama de munheca de samambaia que o persegue ao longo de uma vida tão feliz.

Na hora de escolher o cardápio fez questão de incluir a barqueta de frango, salgadinho de sua preferência em forma de um barquinho.

Para ele, uma festa só faz sentido se for servida a tal barqueta.

É que o salgadinho lhe proporciona um prazer extra-sensorial de produzir aquele barulho único quando os dentes quebram a massa antes de ser engolida.

Ao invés do nome oficial “barqueta”, ele prefere chamar o piteu de “barquinho” em homenagem à sua habilidade de superar com leveza a imensa sequência de tramóias que produz nas águas de uma vida sem medo das ondas gigantescas que atrai para si.

É indescritível o prazer que sente ao produzir o som de quebrar entre os dentes a barqueta/barquinho para comemorar um ato corrupto.

É tanto prazer que ele não resiste à tentação de cantarolar todo feliz a sua música predileta: “o barquinho vai/ e a tardinha cai”.