É a Lama, É a Lama… - Crônica "Estado de Minas" - 11/11/15

Poeta encontra fórmulas inacreditáveis para se expressar. Tom Jobim deu exemplo disso ao nos legar belezas como “Águas de Março”, especialmente nos versos: “É o projeto da casa, é o corpo na cama/ é o carro enguiçado, é a lama, é a lama”.

Só mesmo Tom para usar a lama para enaltecer a realização do sonho de construir uma casa no campo e louvar a natureza, os pássaros, o amor.

Apesar do seu jeito calmo, Tom certamente estaria irritado com a catástrofe da lama nas cercanias de Mariana e perguntaria:

“Como uma civilização que obtém conquistas nunca imaginadas, esquece que “o preço da liberdade é a eterna vigilância”? Como usam até hoje argumentos do tipo deixa andar pra ver como fica; ainda dá tempo para arrumar tudo; a fiscalização só vai aparecer depois das festas de fim de ano; calma que o santo é de barro?

Tom ainda poderia perguntar:

- Será que tudo é consequência da busca pelo prazer absoluto que corroi a superfície e as entranhas do mundo, do consumo exagerado, do egoismo e da pressa para gozar os prazeres da era digital?

- Será que a avalanche aconteceu por causa de um deslize no jeito nada especial de aproveitar os recursos da natureza?

- Não são mais respeitados os principios da Física, da Ecologia, das normas do Bom Senso, da Ética, da Estética e da beleza do mundo?

- Não se leva mais em conta alertas sobre as consequências da destruição da natureza?

- Aonde foram parar os principios da Moral e da Política com P maiúsculo?

Ilusão pensar que Tom Jobim estivesse fazendo tantas perguntas se seu verso emblemático resume tudo:

- É a lama, é a lama…