Na Ponta da Agulha - Crônica "Estado de Minas"- 23/12/2015

Chegou a uma idade bem próxima dos oitenta anos declarando que nunca teve medo da morte. Seu destemor diante da fatalidade se revela na lida pela vida que inclui a cozinha de forno e fogão, um semblante de serenidade e o croché que pratica sentada em uma velha e deliciosa cadeira de balanço que range um pouco como que para compor melodicamente o cenário.

No balanço da cadeira, suas ideias voam com velocidade.

Deixa de lado a miséria moral do mundo cada vez mais consumista sabendo que, na volúpia em que os fatos andam nos tempos cibernéticos, é bobagem sonhar em deixar como legado princípios que nortearam sua vida (honestidade, honradez, sinceridade e sensibilidade) para analisar fatos ao seu redor e no mundo.

Acha que não entenderão esses princípios e muito menos segui-los. Azar “deles” – sentencia com lucidez e franqueza. Seu orgulho é saber dominar a linha e a agulha de croché para praticar a arte na feitura de sapatinhos para bisnetos que não param de nascer, de adornos para forro de mesa considerados maravilhosos e pequenos arranjos de mesa que filhas e noras adoram.

Cada laço que dá na linha a faz pensar no nó que prende a humanidade a uma ideia absurda de felicidade plena diante de um crescimento populacional sem medida e de fragorosa derrota de princípios morais e éticos.

Não gosta de ser chamada de velhinha pois mantém firme sua coluna vertebral e já foi até chamada de “madeira de dar em doido”.

Apesar de tudo, tem esperança de que chegará o momento em que o mundo entenderá a importância do bom senso e da razão. Não será fácil mas, para ela, um dia os donos do mundo vão concluir que é preciso dar uma parada geral nas coisas para reflexão.

Aí, será tarde demais, embora saiba que onde estiver estará feliz com isso.