O Ranço - Poema que Fiz Tempos Atrás mas que Cabe como uma Luva Neste Momento Triste que Vive o Brasil

Fim do Imperio Romano em 4 de Setembro 476
O ranço não morre: ressuscita.
Cravam-lhe estacas no coração
mas o velho vampiro,
careca e de óculos ray-ban
levanta-se do sarcófago
mastigando dentes de alho
e falando em olho por olho,
dente por dente.

O ranço reúne as forças
(parece que são sempre as últimas)
e novamente range a velha carcaça
em busca da morte
dos outros.

O ranço ruge em manchetes
silenciosas
a guerra suja da velhacaria
que comanda na surdina
sob a forma de festa
dos defuntos de sobrecasaca
e colarinhos brancos de
vira-bundinha.

O ranço exala velas
mas proclama como se fosse fragâncias
de outras terras
distantes
das montanhas carcomidas
onde nasceu, vive e reina
e rumina seu ódio pequeno e cruel
sob a capa das verdades falsas,
da moral e dos bons costumes
e dos anacolutos impunes.



O ranço impõe sua incompetência
Inconteste
envolta em grossa cortina de nebulosas fumaças
e envenena as massas
com o ópio do ridículo.


O ranço impregna as velhas estruturas
mas anda de carro
último tipo, vidro fumê
e antena parabólica
como elogio à modernidade
que se contrapõe às suas idéias
tacanhas e voltadas
unicamente para arrancar ouro do nariz.

O ranço canta canções
honestas e imortais
como se tivesse direito
e coração
do alto dos morros mortos
ao som de um plangente violão
de cordas de aço frio de um punhal.

O ranço, em seus éditos,
Exige o primado do óbvio
e da espera de uma melhor oportunidade.
O ranço corroi.
O ranço ri enquanto chora
lágrimas de crocodilo.

O ranço não tem complexo de culpa
nem acredita em Freud,
apesar de todas as análises,
de todos atos-falhos
de toda fantasia
de todos os sonhos com igreja,
de toda impotência.

O ranço tem olhos rútilos
e prega a imortalidade
como bom vampiro
que foi, é e será.

O ranço vence sempre.

Mário Ribeiro