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A Dama do Lotação de Nelson Rodrigues |
Preferiu observar pela janela do coletivo as pessoas que andavam pela rua. Se questionasse o que debatiam aos berros e aos palavrões sobre uma teoria absurda poderia, em troca, ouviria desaforos ou até sofrer agressão física.
Conteve-se. Afinal, na democracia todos têm, em tese, o direito de falar o que bem entenderem. Melhor calar-se e engolir seco do que contrapor com destempero. Não era ambiente para debate acirrado.
Preferível não meter o bedelho no que não era de sua conta e refletir sobre mudanças que ocorrem na comunicação entre os humanos.
Será que tempos atrás um interlocutor também não esperava o outro concluir o que pensava? Haveria, como agora, tanto corte no desenvolvimento do raciocínio do outro ou sempre foi assim? Falava-se com tantos grunhidos, palavrões e expressões chulas?
Então pensou que transitar de ônibus naquela hora tranquila do dia e ver pessoas nas calçadas em busca de realizações da vida lhe trazia calma para pensar que deste mundo nada se leva e, ao contrário do que ocorre principalmente entre os jovens, melhora a comunicação pessoal limpando da cabeça a raiva contra tudo e todos.
O ônibus chegava ao destino.
Antes de descer, concluiu que diante de tantas inovações, parece nada ser impossível de se realizar apesar de o falar atropelado de parte da juventude revelar destruição do que antes nas escolas de primeiro e segundo graus chamava-se “Língua Pátria”.
E pior: impede que se chegue a conclusões nas discussões e que se possa olhar o povo transitando pela rua na calma da tarde.