Caindo na Real - Crônica "Estado de Minas" - 3/3/2016

Puxa vida! Aquela barba bem escura lhe trouxera tanta sorte nas conquistas amorosas que os amigos passaram a vê-lo de forma diferente. Mexeu tanto com seu ego que sentia-se mais corajoso. Só que, de repente, teve de retirá-la. Foi um tortuoso processo desenvolvido na barbearia de seu bairro. O próprio dono do salão fez questão de executar o trabalho lamentando perder a frequência quinzenal do cliente. Nem por isso deixou de caprichar no corte e escanhoar a pele do freguês com navalha.

Enquanto executava a poda dos cabelos, o barbeiro perguntou a causa de decisão tão radical, já que, segundo consta, quem raspa a barba perde pontos não só com as moças mas com a comunidade dos novos tempos em constante evolução existencial.

Como profissional no assunto, informou que o crescimento dos cabelos depende do aumento do nível de testosterona no corpo humano, o que representa mais sexualidade, vamos dizer assim.

Entretanto não era o caso, explicou o jovem nem tão jovem assim. Os motivos para a decisão começavam pela coceira no rosto que não lhe dava trégua, irritando-o profundamente.

Outro obstáculo: na sua banca de produtos variados, o olhar dos fregueses dava a entender que a barba os incomodava, a maioria deles formada por pessoas idosas e exigentes.

Seus pais é que ficaram felizes com a decisão do filho trabalhador e honesto, não que a barba fosse motivo de desconfiança, muito pelo contrário. Para sua mãe, ele voltava a transmitir a natural simpatia que a barba parecia esconder.

Até que um freguês intelectual, dono de portentosa barba, vendo-o com o rosto escanhoado, achou que sua aparência revelava pessoa com o pé fincado na realidade, dizendo:

- De tempos em tempos aparece uma moda e depois todos caímos na real como pregava Freud, aliás um barbudo de peso.