Urtigão e as Artes



Domingo modorrento. Dei-me conta que os embates políticos dos últimos tempos, a procura ávida por novas notícias, os artigos contrários aos petistas, comunistas, adesistas e tanto outros oportunistas surgidos nos últimos tempos fazem-me falta. Sinto falta também da pouca educação da turma da esquerda, dos maus modos de Lula e da grossura quase gaúcha de Dilma Rousseff. Enfim, toca a nós brasileiros lamber as feridas, curti-las com salmoura, para lembrarmos que vão doer por muito tempo.

Somos o país do meio sucesso, ou como disse Millôr Fernandes: Brasil, País do futuro... sempre.

Resolvi, juntamente com madame, dar uma olhada em uma exposição bem avaliada pelos críticos, alojada no Centro Cultural Banco do Brasil. Não demorei a descobrir qual a razão de Nuno Ramos (este é o nome da figura) ser chamado de "multiartista".

As instalações de Nuno Ramos ocupam quase um pavimento inteiro do belo prédio que alojou a Secretaria do Interior e Justiça e, depois, a Secretaria de Segurança Pública. Aliás, visitar prédios históricos nos ajuda a ter uma visão bem ampla da burocracia no Brasil, seus desdobramentos e as diversas nuances deste monstro, a cada dia mais aparente, sempre pronto a dar e ter filhotes, objetivando alojar amigos, correligionários e apoiadores de primeira e de última hora. Numa breve resenha sobre o edifício e sua ocupação, percebe-se os desdobramentos e os filhotes que a antiga secretária já rendeu.

Uma lástima.

Visitar prédios históricos também nos dá a dimensão e a abrangência das alianças políticas.

Lá, ainda no histórico do prédio, pudemos saber que o secretário do Interior na época, o ex-governador Olégario Maciel, antes de apoiar a Revolução de Trinta, pediu a benção de Arthur da Silva Bernardes, grão senhor do PRM (Partido Republicano Mineiro), depois simplesmente PR. Em 1930, Bernardes, o rei dos jagunços apoia Vargas. Em trinta e dois, Bernardes já está em outra trincheira. Apoia a Revolução Constitucionalista e se coloca contra Vargas.

Esse apoio rendeu um episódio interessante.

Viçosa, terra de Bernardes, foi bombardeada pela aviação de Vargas. Depois dizem que o Brasil é um país pacifico.

Louve-se iniciativas tais como as existentes na Praça da Liberdade feitas por Aécio Neves.

Transformar prédios públicos em centros culturais é bom para a cidade. Precisamos de informação sobre ela. A cultura é conseqüência.

E a exposição: Infelizmente, a minha inteligência não alcança as ideias do multiartista e suas instalações. Nada significou para mim. Nada entendi e tampouco não gostei de nada. Valeu pela visita ao prédio, que eu não revia desde 1962, ocasião em que lá estive para tirar uma carteira de identidade para fazer vestibular.

Notas

Na minha ida a Praça da Liberdade apanhei um resto de manifestação política que acredito deve ter sido a favor de Dilma Rousseff . Vi uma cena que me comoveu. Estava almoçando uma salada numa lanchonete da praça quando lá entrou uma família.

Fiquei triste por mim e por eles. A avó, com uma camiseta onde se lia : "Não vai ter golpe. Vai ter luta".

O filho, bem moço, quase imberbe, carregava o filho, ainda de colo. A camiseta do rapaz de cor vermelha tinha no peito a sigla CCCP, algo que já morreu até para os russos com a dissolução da União Soviética, no século passado. Nas costas da camiseta, lia-se Lenin e o número nove. Nunca soube que ele tenha jogado futebol. A criança e a nora com camisetas vermelhas. Uma tristeza, tão jovens e seguindo por uma estrada que não os levará a lugar algum.

Significado da sigla CCCP

Na copa do mundo de 1958, a Rússia era apresentada como o grande bicho-papão. Falava-se no uso de um computador (ninguém sabia o que era) para orientar as jogadas. Enfim, o país do Sputinik era "o bicho" em Itaúna. Na época, eu morava na cidade e vi uma discussão num botequim sobre o significado das letras CCCP. Ninguém sabia, pois, afinal, era a grafia em russo de União das Repúblicas Socialistas dos Sovietes.

Impasse resolvido pelo Vicentão, massagista do Esporte Clube de Itaúna. Com pompa e circunstância anunciou que o significado era: Comunista, Comunista, Comunista Paca!

Esplendor e Glória

Uma lágrima e muitos aplausos para Cauby Peixoto. Morreu o maior cantor do Brasil, um artista de luzes, esplendor, brilho e glória.

Uma voz belíssima, capaz de cantar o que quisesse, com um domínio de palco extraordinário, capaz de fazer inveja a grandes artistas estrangeiros e de calar de vergonha os cantores de hoje que nada cantam.

Jogado no ostracismo pelos intelectuais de esquerda, Cauby nunca se abateu e continuou cantando como nunca. Cantava sem esforço, por puro prazer. Chegou a dizer que se não ganhasse para cantar, pagaria para fazê-lo.

Ao contrário do Cauby dos palcos, era tímido e de ótimo trato.

Vai brilhar no céu.

Urtigão (desde 1943)