Urtigão: Deus Ajuda a Quem Cedo Nadruga ou Quem Chega na Frente Bebe Àgua Limpa

Adoration of the Golden Calf by Andrea di Lione
Gosto muito de ditos populares. Neste título, onde duas expressões são quase sinônimas, estão contidas muitas verdades que explicam o sucesso ou o fracasso.

Dito isso, vamos aos fatos. Há dois anos uma investigação pequena, começada em Brasília para investigar um esquema de troca de dólares e lavagem de dinheiro em um posto de gasolina transformou-se em algo nunca visto em investigações policiais e judiciais no Brasil. Bastou que caísse em mãos certas e honradas, com experiência em lavagem de dinheiro, para tomar proporções nunca vistas, trazendo à tona esquemas de corrupção política e assalto a empresas públicas, algo existente no País desde a Constituinte de 1946 e que em setenta anos vinha dominando todo o sistema de financiamento de campanhas políticas em todos os níveis.

O mais interessante de toda a história de horrores agora colocada a nu pelo Juíz Sérgio Moro, o Ministério Público Federal, a Polícia Federal e Receita Federal é que o sistema ilegal era feito às claras, sem nenhum pudor em esconder os fatos.

Explico: como justificar o despropósito de gastos cada vez maiores com campanhas políticas no Brasil, sem que o político esperasse uma recompensa maior durante o mandato? Pelo bem do povo? Pelo bem de sua cidade? Pelo bem de seu Estado ou do próprio País? Seria pedir muita benemerência e patriotismo de uma classe que só se lembra de cantar o hino nacional em dias de vitórias políticas. De preferência de braços dados a marcharem como tropa de elite em busca de inimigos imaginários. O sistema perverso e desonesto foi aperfeiçoado na Constituição de 1988, colocando-se sobre a tutela do Legislativo tudo aquilo que porventura pudesse ser revertido em ganhos ilícitos mais para a frente. Facilitou-se a criação de partidos políticos, siglas de aluguel vivendo de fundo partidário e do empréstimo da legenda para coligações estapafúrdias. Mais gente para ser corrompida, mais gente para usufruir de favores, compadrio e falcatruas.

Difícil de perceber? Nada disso. Sinais exteriores de riqueza são abundantes e não só na classe política.

Como se não bastassem todas as benesses destinadas aos parlamentares, era preciso prover também benefícios para familiares e empresários que contribuíssem com a eleição da "autoridade". Perderam a vergonha até para arranjar desculpas. Dinheiro ganho com venda de bois mais caros do que o bezerro de ouro da Bíblia, sêmen bovino para pagar empréstimos milionários. Carne enlatada vendida a preço de platina para países africanos.

E ainda dizem que o Juiz Sérgio Moro foi obra do acaso. Acaso uma ova. Era o homem certo na hora certa. Especialista em crimes de lavagem de dinheiro, estudioso da Operação Mãos Limpas e juntamente com os jovens procuradores da Força Tarefa de Curitiba, adeptos do Direito anglo-saxão, capaz de fazer acordos com criminosos, desde que pretendam contribuir com a investigação. Uma conjunção única de fatores que propiciaram e propiciam passar o Brasil a limpo. Um círculo virtuoso que está longe de chegar ao seu final.

Muita coisa ainda está para ser dita e esclarecida e que o exemplo da Turma de Curitiba frutifique Brasil afora. Muitos bons juízes estão à espera de uma boa causa e com os mecanismos existentes hoje na Receita Federal, fica mais fácil apanhar um sonegador do que um coxo. Muitos procuradores estão prontos para agir. Basta querer procurar pois andam fazendo uso da sabedoria popular de que "capeta aparece para quem quer". E vão aparecer aos magotes.

Notas:

1) Ouvi de Cristiana Lôbo no seu "Fatos e versões" que as coisas vão piorar de vez para o governador de Minas no próximo mês de Agosto. Agosto é mês de cachorro louco e de fatos políticos inimagináveis no Brasil desde há muito. Conselho ao mandatário: homem prevenido usa cinto e suspensório.

2) O ministro do turismo (uma inutilidade) deixou o cargo. Tem dinheiro na Suíça. Se existe alguma coisa no Brasil que não funciona, chama-se promoção turística. Deixemos de lado o ufanismo e vamos cair na real. Fica difícil promover um destino turístico que não oferece segurança, assistência a saúde, transporte decente e preços honestos.

Urtigão (desde 1943)