URTIGÃO: Raridade - Uma Lágrima por um Político


Derramo uma lágrima por Hélio Garcia. Nos dias de hoje, chorar a perda de um político é coisa rara. Mais raros ainda os políticos que merecem o nosso choro nestes tempos "bicudos".

Conheci Hélio de Carvalho Garcia por acaso. Trabalhava no "finado" Hotel Del Rey, bem em frente a também "finada "Minascaixa, onde Hélio Garcia era presidente. Eu o via quase todos os dias pois ele era frequentador habitual do bar do hotel, um "pub" pequeno e discreto, abaixo do salão de estar. Nessa época não cheguei a travar contato mais íntimo com ele. Andava sempre com os mesmos amigos, subordinados dele no banco estadual.

Deixei o hotel em 1979, estive no interior do Estado e voltando a Belo Horizonte, assumi a gerência do Serrana Palace Hotel. Pouco tempo depois, recebi um recado do dono do hotel, Newton Lima Drumond. Era para informar-me que o Dr. Hélio e seu fiel escudeiro, Gileno Novais iriam se hospedar no hotel esporadicamente. Cabia ao Dr. Hélio a coordenação da campanha de Tancredo Neves a governador do Estado nas primeiras eleições diretas após a abertura. Ordens de não abrir fatura e tampouco cobrar contas. Era a contribuição do hoteleiro para a campanha de Tancredo e Hélio.

Assim foi feito.

Gileno Novais passou a morar no Serrana e, quando Hélio Garcia estava para chegar, sempre me avisava na gerência. O político grandalhão e tímido aparecia como um cometa. Conversava pouco.

Era um urtigão, muito mais por timidez do que por falta de cordialidade. Era um homem calado sem ser casmurro. Bebia bastante mas nunca foi descortês com nenhum funcionário.

Tratava-nos todos com igualdade. Pouco pedia e nada incomodava.

Uma manhã, ao recebê-lo, ele me surpreendeu com uma pergunta: 

- Qual era a tendência dos funcionários do hotel no tocante à eleição?

Disse-lhe sem meias palavras que o clima era favorável a Tancredo Neves e que eu, como gerente e amigo da maioria, havia prometido dar uma festa para os funcionários, às minhas custas, fora do hotel, caso a chapa encabeçada por Tancredo se tornasse vencedora.

Dito e feito: eleição ganha, Tancredo e Hélio Garcia eleitos, cumpria-me fazer a prometida festa.

Graças a um bom amigo na época na gerência da Cinzano, consegui sem ônus as bebidas para o "rega-bofe". Os "comes" foram feitos no hotel, por colaboração de Newton Lima Drumond. Clima de euforia, bebida e comida farta e para coroar a noite, eis que por lá aparece Hélio Garcia, na companhia de Leopoldo Bessone e Gileno Novais. O homem tímido e caladão foi pessoalmente agradecer a mim e aos funcionários do hotel.

Gesto de nobreza, principalmente depois de eleito vice-governador e articulador maior das alianças que levaram ele e Tancredo à vitória. E não ficou só nisso: entregou-me dias depois um convite para a posse de Tancredo e dele. Declinei da honraria mas fiquei tocado pela gentileza em distinguir-me entre muitos.

Político diferente. Nobre de caráter, fiel aos amigos, incapaz de perseguir quem quer que fosse.

Morreu só da mesma forma que viveu muitos anos em sua fazenda em Santo Antônio do Amparo.

Os políticos que foram ao seu velório. me perdoem o desabafo. Nenhum deles teve a grandeza, o desprendimento e a lealdade de Hélio de Carvalho Garcia.

Que Deus o tenha.

Urtigão (desde 1943)

Notas:

1) Ainda sobre Hélio Garcia. Lançado como candidato a senador da república em 1995, teve a prudência de renunciar à candidatura: teria de enfrentar o rolo compressor de José Alencar Gomes da Silva, com todo o poderio da Fiemg, do Sesi e Senai e de suas empresas.

O ex-governador retirou-se da contenda e voltou para sua fazenda.

José Alencar ganhou a eleição e de legado deixou-nos Luis Inácio Lula da Silva.

2) Ouço na CBN que o Comitê Olímpico andou cortando despesas com transporte e cópias de memorandos, súmulas e sei lá mais o quê, para diminuir gastos. Com direito a palavras de Carlos Arthur Nuzmann a louvar os cortes. Informação do repórter que não consegui apurar o nome.

A Rio 2016 demonstra que é possível fazer uma Olimpíada sem "luxúria".

Depois ficam estabacados quando Temer usa uma mesóclise.

Pobre Língua Portuguesa.