Artefato do Futuro - Crônica “Estado de Minas” 21/07/2016

Ela tinha pressa (aliás, todos andamos numa pressa danada). Tanta pressa que se esgueirou entre um grupo de pessoas para abrir caminho quase correndo no shopping não tão frequentado assim naquele dia de semana do inverno de preguiça e crise econômica.

Detalhe instigante é que sua correria não a impedia de dar atenção a dois celulares que carregava, um em cada mão.

Ela dialogava com alguém no celular que segurava na mão direita enquanto verificava as mensagens recebidas no celular da mão direita.

Para as pessoas em volta parecia ser absolutamente normal aquela acrobacia interativa dos novos tempos.

A inserção digital é tão avassaladora que o uso, ao mesmo tempo, de dois celulares pode ser visto como extraordinário “avanço”, mesmo que entre aspas.

Não será absurdo imaginar que em breve alguém passe a caminhar pelas ruas sem prestar atenção no que acontece em volta pois vai crescendo a compulsão de não parar de transmitir e receber mensagens e fotos em substituição a práticas seculares de convivência.

Nessa linha de raciocínio, podem surgir artefatos de design avançado para que a pessoa, enquanto caminha pela cidade e nos shoppings, tenha à disposição quatro ou mais celulares para usar simultâneamente, todos interligados.

Será um grande sucesso de marketing enquanto nós, ainda humanos, certamente iremos perdendo cada vez mais a noção do que seja gentileza e visão do próximo ou de ter sonhos para o futuro.

Aliás, não haverá mais sentido sonhar como previram os Beatles quando afirmaram que “the dream is over”.