Este verão tem sido de chuvas intermináveis em São Paulo e de acordo com os institutos meteorológicos, um volume e intensidade de água que não se vê há mais de 70 anos na cidade. O resultado não poderia ser outro, alagamentos sem fim, queda de árvores, transformadores que estrondeiam e diariamente há falta de luz em quase todos os bairros da cidade.
E assim foi na casa da avó, que inspirada logo no início da semana, convidou filho, filha, genro e netos para um jantar em plena 2ª feira.
Como de costume, primeiramente sentaram todos juntos na sala, para tomar um suco e diminuir o ritmo agitado que cada um traz do longo dia de trabalho e estudos. Todavia, como não poderia ser diferente, cada um com seu celular na mão, adolescentes e adultos, incluindo a avó, que resolve aderir ao movimento indo buscar seu aparelho também. Ela diverte-se com os vídeos e piadas que recebe a cada minuto nos diversos grupos que participa pelo whatsapp, ao mesmo tempo que xinga diversas vezes como as pessoas podem mandar tantas mensagens? Será que ninguém tem o que fazer?
De repente começam os trovões e raios, acompanhados por uma tempestade avassaladora. Não demora muito para ouvirem a explosão de um transformador na rua e os olhares sobressaltados são cobertos pela escuridão. O consolo é que celulares continuam a todo vapor e não só isso, após alguns minutos, todos já estão compartilhando as notícias sobre os pontos da cidade mais atingidos pela tempestade.
Acaba a bateria do celular da avó. Ela acende algumas velas na sala para as “crianças” não sentirem medo, comunicando que vai terminar os preparativos do jantar. Leves movimentos de cabeça sinalizam que ouviram o recado.
Como se fosse uma obra do destino, os outros celulares também ficam sem bateria, até porque o dia estava terminando e geralmente os aparelhos estão descarregados. E agora? Não há tv, Ipod, Ipad e nem computador!
Não resta outra coisa a fazer a não ser ir tumultuar os preparativos para o jantar. A pobre avó que estava tranquila em sua cozinha, iluminada por uma luz de emergência que comprou no mercadinho do bairro, viu-se de repente rodeada por dedos famintos e curiosos abrindo as panelas, geladeira, armários, a caça de qualquer coisa para enganar a fome e ao mesmo tempo ocupar o tempo que, de repente, parecia infinito. Impaciente, mas afetuosa, a avó acende novas velas na mesa da cozinha, tornando o ambiente acolhedor para aquelas mentes e corpos acelerados. Como um convite para que já se acomodem, serve algumas guloseimas informando que a janta já vai sair !!! Agora a luz de emergência desliga também, talvez porque não foi carregada completamente.
Surge o cenário de um palco em que os tecidos se abrem de repente. Luz de velas e silêncio. A simpática avó entra triunfante e sugere uma solução para aquele momento incógnito. “Eu tenho um rádio velhinho que funciona com pilha, vou busca-lo para ouvirmos as notícias ou, quem sabe, até uma boa música”. Coloca-o sobre a mesa e de repente reproduz-se uma nova cena que remete ao século passado, em que familiares se amontoavam ao redor dos aparelhos de rádio, para sintonizar uma estação e ouvir as notícias do dia. Rádio FM ela já avisa que não funciona bem na cozinha, mesmo com antena puxada. “Antena vó?”. “ É, tem que puxar a antena! “
O filho logo assume a tarefa e as únicas estações que consegue sintonizar da rádio AM, claro, trazem notícias sobre futebol. Com um sorriso que mal cabia no seu rosto, ele comemora a sua sorte e a avó, conclui que as mulheres costumavam assistir à novela naquele horário, por isso no rádio só se ouve o futebol. E em meio a um coro de risadas, ela mesma tenta sintonizar uma outra estação, até achar a Super Rádio. Além de um nome sui generis para o momento, a Super Rádio tocava uma música brasileira com melodia contagiante e um texto cheio de “travessuras” sobre variedade de comidas e cantiga de rodas. O filho logo levanta puxando a vovó para dançar, enquanto genro e netos batem palmas e o filha se diverte tentando camuflar a malícia do texto, elucidando para as filhas o que era o tal jogo “Escravos de Jó” quando é citado na letra “guerreiros com guerreiros fazem zigue zigue zá”. (https://www.letras.mus.br/amado-batista/o-negocio-da-china/). O cachorro late participando da festa, feliz com aquele movimento súbito e incomum.
Toda família se debruça na mesa de tanto rir ao escutar as outras músicas e toda vez que entra a vinheta da “Super Rádio obaaaaaaaaa”, os risos transformam-se em gargalhadas. O ápice ocorre quando começa a música de Roberto Carlos e seu estilo inconfundível, como a cereja do bolo daquela noite inusitada.
A trilha sonora embalou o jantar e todo aquele encanto que, como uma onda sonora, envolveu aquela família, suas mentes e suas almas. Registros históricos apontam que a primeira transmissão de som por ondas de rádio aconteceu no final do século 19. Entretanto, o rádio resiste, exercendo um papel principal, como veículo de informação e entretenimento.
Mas a escuridão ainda guardava outra surpresa. Após o jantar, a avó pediu que todos a acompanhassem até o jardim escuro, cada um com uma vela na mão. Conhecida por seus dedos verdes, encaminhou a família ao jardim secreto para mostrar uma flor, bastante rara, que abre e morre numa só noite. E o destino escolheu aquela noite, para exibir sua beleza efêmera e infinita. Olhos e sorrisos atônitos admiram a flor iluminada por velas e a melodia das palavras da avó. Como se a Super Rádio continuasse a tocar no jardim.
E assim foi na casa da avó, que inspirada logo no início da semana, convidou filho, filha, genro e netos para um jantar em plena 2ª feira.
Como de costume, primeiramente sentaram todos juntos na sala, para tomar um suco e diminuir o ritmo agitado que cada um traz do longo dia de trabalho e estudos. Todavia, como não poderia ser diferente, cada um com seu celular na mão, adolescentes e adultos, incluindo a avó, que resolve aderir ao movimento indo buscar seu aparelho também. Ela diverte-se com os vídeos e piadas que recebe a cada minuto nos diversos grupos que participa pelo whatsapp, ao mesmo tempo que xinga diversas vezes como as pessoas podem mandar tantas mensagens? Será que ninguém tem o que fazer?
De repente começam os trovões e raios, acompanhados por uma tempestade avassaladora. Não demora muito para ouvirem a explosão de um transformador na rua e os olhares sobressaltados são cobertos pela escuridão. O consolo é que celulares continuam a todo vapor e não só isso, após alguns minutos, todos já estão compartilhando as notícias sobre os pontos da cidade mais atingidos pela tempestade.
Acaba a bateria do celular da avó. Ela acende algumas velas na sala para as “crianças” não sentirem medo, comunicando que vai terminar os preparativos do jantar. Leves movimentos de cabeça sinalizam que ouviram o recado.
Como se fosse uma obra do destino, os outros celulares também ficam sem bateria, até porque o dia estava terminando e geralmente os aparelhos estão descarregados. E agora? Não há tv, Ipod, Ipad e nem computador!
Não resta outra coisa a fazer a não ser ir tumultuar os preparativos para o jantar. A pobre avó que estava tranquila em sua cozinha, iluminada por uma luz de emergência que comprou no mercadinho do bairro, viu-se de repente rodeada por dedos famintos e curiosos abrindo as panelas, geladeira, armários, a caça de qualquer coisa para enganar a fome e ao mesmo tempo ocupar o tempo que, de repente, parecia infinito. Impaciente, mas afetuosa, a avó acende novas velas na mesa da cozinha, tornando o ambiente acolhedor para aquelas mentes e corpos acelerados. Como um convite para que já se acomodem, serve algumas guloseimas informando que a janta já vai sair !!! Agora a luz de emergência desliga também, talvez porque não foi carregada completamente.
Surge o cenário de um palco em que os tecidos se abrem de repente. Luz de velas e silêncio. A simpática avó entra triunfante e sugere uma solução para aquele momento incógnito. “Eu tenho um rádio velhinho que funciona com pilha, vou busca-lo para ouvirmos as notícias ou, quem sabe, até uma boa música”. Coloca-o sobre a mesa e de repente reproduz-se uma nova cena que remete ao século passado, em que familiares se amontoavam ao redor dos aparelhos de rádio, para sintonizar uma estação e ouvir as notícias do dia. Rádio FM ela já avisa que não funciona bem na cozinha, mesmo com antena puxada. “Antena vó?”. “ É, tem que puxar a antena! “
O filho logo assume a tarefa e as únicas estações que consegue sintonizar da rádio AM, claro, trazem notícias sobre futebol. Com um sorriso que mal cabia no seu rosto, ele comemora a sua sorte e a avó, conclui que as mulheres costumavam assistir à novela naquele horário, por isso no rádio só se ouve o futebol. E em meio a um coro de risadas, ela mesma tenta sintonizar uma outra estação, até achar a Super Rádio. Além de um nome sui generis para o momento, a Super Rádio tocava uma música brasileira com melodia contagiante e um texto cheio de “travessuras” sobre variedade de comidas e cantiga de rodas. O filho logo levanta puxando a vovó para dançar, enquanto genro e netos batem palmas e o filha se diverte tentando camuflar a malícia do texto, elucidando para as filhas o que era o tal jogo “Escravos de Jó” quando é citado na letra “guerreiros com guerreiros fazem zigue zigue zá”. (https://www.letras.mus.br/amado-batista/o-negocio-da-china/). O cachorro late participando da festa, feliz com aquele movimento súbito e incomum.
Toda família se debruça na mesa de tanto rir ao escutar as outras músicas e toda vez que entra a vinheta da “Super Rádio obaaaaaaaaa”, os risos transformam-se em gargalhadas. O ápice ocorre quando começa a música de Roberto Carlos e seu estilo inconfundível, como a cereja do bolo daquela noite inusitada.
A trilha sonora embalou o jantar e todo aquele encanto que, como uma onda sonora, envolveu aquela família, suas mentes e suas almas. Registros históricos apontam que a primeira transmissão de som por ondas de rádio aconteceu no final do século 19. Entretanto, o rádio resiste, exercendo um papel principal, como veículo de informação e entretenimento.
Mas a escuridão ainda guardava outra surpresa. Após o jantar, a avó pediu que todos a acompanhassem até o jardim escuro, cada um com uma vela na mão. Conhecida por seus dedos verdes, encaminhou a família ao jardim secreto para mostrar uma flor, bastante rara, que abre e morre numa só noite. E o destino escolheu aquela noite, para exibir sua beleza efêmera e infinita. Olhos e sorrisos atônitos admiram a flor iluminada por velas e a melodia das palavras da avó. Como se a Super Rádio continuasse a tocar no jardim.
Monica Theiser