Urtigão e o Circo dos Horrores

Sou de um tempo politicamente incorreto. Tempo no qual botar apelido nas pessoas era lugar comum. Tempo em que espetáculos mambembes e itinerantes percorriam o Brasil. 

Anões, Monga a Mulher Macaco, mulher barbada, bezerros de três pernas, Museu de Cera e outras anomalias faziam parte do show. Mais do que isso: meio de sobrevivência de muita gente e podia até derivar em fortunas. 

Nesse aspecto, nada superou o americano P.T. Barnum, empresário, showman e dono do circo que se intitulava "O Maior Espetáculo da Terra". Circo que virou filme e durou por mais de um século e meio. Encerrou suas atividades em maio de 2017, por perseguição dos defensores de animais e outros politicamente corretos.

O Circo Ringling Barnum tinha nada mais nada menos do que uma orquestra de elefantes tocando trombetas. Quem viu, visse. Quem não viu, nunca mais verá ao vivo. Anomalias eram muitas. Basta lembrar que as cabeças de Virgulino Ferreira, o "Lampião" e seu bando, cortadas depois do Cerco de Angicos, foram conservadas no formol por quase quarenta anos. Expostas em quase todo o Nordeste e depois guardadas em latas de banha no Museu de Medicina Legal de Salvador. Macabro, mas verdadeiro. Somente nos anos sessenta do século passado, foram sepultadas. Se é que foram.

O brasileiro está acostumado a coisas macabras e anormais. No entanto, nada supera uma Sessão de votação na Câmara dos Deputados. Aconteceu novamente ontem, dia 25/10. Votação da segunda denúncia contra o Presidente Michel Temer. 

Um espetáculo, se filmado, supera o Circo dos Horrores, filme de 1960, supera os espetáculos de Barnum e tudo mais que possa causar horror, nojo, asco e sentimentos do gênero. Imbatível em todos os aspectos. Transmitido na íntegra pela maior emissora de televisão do País, não só pelo canal pago. Transmitido ao vivo pela TV aberta, atropelando os "carros chefe" da Globo: novelas e o Jornal Nacional.

Assisti um pedaço. Os parlamentares, me parece, que abandonaram de vez o figurino "Casa José Silva". Ternos mais bem cortados e camisas mais discretas. Saíram de cena as gravatas vermelhas e as cor de rosa. A cor predominante agora é a azul, em todos os seus matizes. Lisas, de "pois", listradas e regimentais. Cabelos, na maioria, bem pintados de preto "grauna" ou o indefectível acaju. Alguns, com certeza, fizeram "mis en plis", seguindo o exemplo das colegas parlamentares. 

Todos e todas, no gozo dos minutos de fama, a vomitar asneiras e encenar um espetáculo de hipocrisia, falta de ideias, de raciocínio lógico, de coerência e de vergonha na cara. Deprimente em todos os sentidos, sem comparação com nada visto, a não ser pela votação da primeira denúncia. 

Homens e mulheres já entrados em anos, a segurar cartazes com palavras de ordem idiotas, contrariando de maneira insuperável, o procedimento digno que se espera de representantes eleitos pelo povo e pagos com o dinheiro suado de brasileiros honestos. 

Faltante, só a trilha sonora. Quem sabe, música da "Brigada Brancaleone", do próprio "Circo dos Horrores" ou do "Fantasma da Opera" .Quem sabe, músicas da "Opera do Malandro" . Vai faltar bosta pra jogar em tanta Geni . 


Urtigão ( desde 1943)

Urtigão é pseudônimo de José Silvério Vasconcelos Miranda, nascido em Rio Piracicaba/MG, em 1943