
O herói gaulês, Asterix e seu inseparável escudeiro Obelix, protagonizam um filme de 1976, no qual são incumbidos de realizar doze trabalhos. As tarefas foram impostas por Júlio César, imperador de Roma, para livrar a aldeia dos gauleses da dominação.
Os dois heróis, genial criação de Rene Goscinny e Albert Uderzo, conseguem realizar os trabalhos, com audácia, força e determinação. Quase sucumbem numa das tarefas, na qual se viram obrigados a derrotar a burocracia gaulesa.
O filme é impagável e está disponível na Web. Lembrei-me do herói da Mitologia Grega, Hércules ou Heracles, ou ainda Alcides. Filho bastardo de Zeus com Alcmene, foi castigado por Hera, a esposa traída de Zeus. A ele foi dada a missão de realizar doze tarefas, todas elas quase impossíveis. O herói, com o auxílio de um sobrinho conseguiu o feito e se tornou imortal. Quem quiser saber mais, consulte a Wikipedia.
Revendo o impagável filme francês, pus-me a pensar o que teria sido a vida de Hércules, caso tivesse de cumprir as normas da burocracia tupiniquim. Certamente sucumbiria. Logo de saída, teria de comprar o caderno de regras da licitação e cumprir todas as exigências legais.
Provar total capacidade técnica, com diplomas e atestados de competência. Em seguida, orçamento completo em linguagem compatível com os padrões exigidos para processamento, em pen drive, com plantas, cálculos, timeline, deadline em planilhas Excel e follow up para acompanhamento.
Caso não tivesse diploma, atestados de notório saber e certificados de trabalhos anteriores com declaração juramentada dos contratantes anteriores. As planilhas de custo de todas as tarefas deveriam ser detalhadas caso a caso, sem emendas ou rasuras e sem direito a reajustes de qualquer natureza excluindo-se todo e qualquer motivo ou pretextos, mesmo que fossem motivados por catástrofes naturais, roubo, desvio de recursos por terceiros ou qualquer outra causa disposta na licitação original.
Aliás, o processo licitatório deveria ser aberto a todos os heróis gregos com cadastro no Olimpo, eliminando de imediato, todo e qualquer concorrente que não pudesse preencher este requisito básico.As planilhas de custo deveriam prever toda a logística para deslocamento, máquinas equipamentos, material bélico e a capacidade de reposição de todos os itens listados.
A lista é longa e não vou cansar os leitores do blog com enumeração de posturas legais obrigatórias. Certamente, o pagamento de Hércules não poderia ser feito diretamente e ele deveria abrir conta corrente no Banco do Brasil ou na Caixa. Tudo deveria ser orçado em Reais, mesmo quando os trabalhos fossem executados fora do território grego.
Apesar de constar entre as tarefas, a captura do cão cérbero, o guardião do inferno, a vida de Hércules se tornaria uma casa de Satanás e a sua reputação ilibada seria manchada e denegrida não só na Grécia, mas em Creta, Tróia, Cartago e onde mais a ira dos deuses pudesse alcançar.
Enfim, a lenda do herói teria outro final, podendo terminar na Papuda, esgotados todos os recursos, incluindo embargos declaratório e embargos infringentes no Supremo Tribunal Federal.
Posso até imaginar as discussões acaloradas entre Lewandowski e Gilmar Mendes e a intervenção sabia de Celso de Mello e a conclusão final da ministra Carmen Lúcia. Com todas as desculpas e vênias.
Urtigão (desde 1943)
Urtigão é pseudônimo de José Silvério Vasconcelos Miranda, nascido em Rio Piracicaba/MG em 1943.