Eu Te Odeio, Eu Te Amo - Correspondente Internacional

Com os dias voltando a passar rapidamente mais uma vez, vemos o mundo entrar na fase pós -pandemia.

As histórias de viagens, furando a pandemia, que eram contadas com peito cheio em bares praticamente ilegais, tomando uma deliciosa cerveja não artesanal, e que mantinham atentos os ouvidos dos amigos pela coragem do viajante, hoje voltaram a ser coisa do cotidiano, já que todo o mundo voltou a viajar.

Outra coisa que voltou para felicidade dos Tios Herodes de todo planeta, foram as crianças no nosso convívio social. Os anjinhos indefesos e insaciáveis nos dão o ar da graça em qualquer local, praça, avião ou restaurante. Podemos mais uma vez nos deliciar com seus choros, birras, gritos estridentes e falta de educação que faz parte desta faixa etária intrigante.

É até maldade falar isso... as crianças e os adolescentes foram os que mais sofreram nos últimos dois anos. Ambos viraram cobaias digitais nas mãos de adultos que inventaram e realizaram as ineficientes e irritantes aulas virtuais.

Não bastava o trauma de viver em isolamento, longe dos amigos, os forçamos a assistir aulas pelo telefone, computador e tablet. Tornando-os em seres ainda mais dependentes de aparelhos tecnológicos que a cada dia enche seus quartos com mais internet e jogos eletrônicos.

A educação via smartPhones trouxe como consequência o quase desaparecimento das perguntas engraçadas, das criticas inapropriadas e das piadas inocentes que a maioria das crianças e jovens deveriam fazer para constranger e alegrar os adultos.

Certo está o Davi. Garoto esperto, com seus 12 anos, ele não deixou a pandemia tirar sua imaginação e curiosidade. O Davi quer saber. Quer saber sobre tudo. Então, quando vê a oportunidade, chega e manda a pergunta: 

- Você poderia me explicar de forma simplificada e rápida a teoria da relatividade?

Você para por um segundo... manda aquele "veja bem..." e ganha um tempo para  inventar algo e fingir que não matou a aula de física quântica. Quando pensa que saiu da saia curta, no próximo segundo Davi muda de tópico e sem deixar a pelota cair pergunta olhando nos olhos: 

- Como funciona um MicroChip? 
- Porque Kiev não é mais a capital da Russia? 
- Qual o material base das células fotovoltaicas?

Precisamos de mais Davis no planeta. De crianças e jovens que instiguem os adultos. Que mostrem como o mundo é cheio de perguntas a serem respondidas.

Infelizmente o numero de Davis vem diminuindo. Vemos crianças apáticas andando na barra da saia da mãe. Sem brilho nos olhos. Pais e mães super protegendo contribuem para a diminuição de bom constrangimento adulto. Deixamos eles com medo de tudo e de todos. Para piorar a criançada nem pode mais fazer travessuras. Os pais não deixam nada escapar. Agora até GPS colocam na mochila e celulares. O próximo passo será finalmente a mãe comprar uma capa de plástico bolha que vestirá no pimpolho antes de ir para a escola.

A situação nos leva a uma óbvia conclusão sobre a pandemia. A maioria não aprendeu quase nada durante os meses de reclusão e máscaras obrigatórias.

Uma outra atividade que foi banida sem dó nem piedade na rigidez dos protocolos "para sua segurança" foi fechamento das salas de cinema. Sim, elas ainda existem mas continuam vazias. 

Novos filmes tentam trazer de volta a possibilidade do jovem pegar sozinho um ônibus e ir até ao centro da cidade para encontrar um amigo ou paquera. Não seria muito melhor investir em um ingresso de cinema, pipoca e coca-cola, do que em mais um um serviço de streaming?

Se os pais forem inteligentes e se lembrarem dos seus dias de jovens, quem sabe voltarão a motivar seus filhos e filhas a se arriscarem um pouquinho. Irem sozinhos no escurinho do cinema. Lá poderão iniciar um romance. Uma amizade. Ou os dois. Chupando drops de anis vendo o novo-velho Batman ou a sequência das fantasias mágicas do Harry Potter. 

E se por uma sorte divina, errarem de sala no cinema e entrarem na que está passando o filme “Eduardo e Mônica”, ai sim terão uma grande experiência de vida.

"Eduardo e Mônica" deveria ter sido o filme indicado pelo Brasil ao Oscar como melhor filme estrangeiro. Merecia artigos em jornais, em blogs. Videos no Youtube com "influencers" de cabelo azul incentivando a conhecer. Deveria ter centenas de milhares de likes nas mídias sociais. Infelizmente parece que entrou em cartaz e sairá sem muito alarde.

A historia de dois jovens que um dia se encontraram sem querer, e conversaram muito mesmo par tentar se conhecer. Que tinham tudo para dar errado, mas com muita determinação e amor terminam juntos. 

O roteiro baseado na música do poeta rebelde Renato Russo e sua Legião tem a mensagem que precisamos nesta fase pós-pandemia.

Lembrar que a vida as vezes tem que ser louca. Ser jovem. Na idade ou na mente. E que você explore as coisas boas da vida antes que a velhice física te pegue de vez. Que é importante sair da rotina por algumas horas ou um par de dias. Quem sabe vale a pena passar um mês de férias em uma praia quase sem dinheiro. E que fazer essas pequenas loucuras nã
o vai matar ninguém. Na verdade é fundamental para o crescimento individual e evolução da sociedade.

Vai lá garoto, coragem garota. Encha sua mochila de perguntas. Pegue uma carona. Suba no Jipe verde do amigo. Invista em uma aventura. Está na sua hora de arriscar. Pular na cachoeira e sentir a água gelada na pele. Parar no posto de gasolina, quase morto de fome, e comer o mais delicioso frango de televisão da sua vida. 

Aceite o desafio de um emprego em outra cidade. Em outro país. Enfrente o trampo que vai quase te matar de trabalhar, e te encher de saudade de casa.

Tudo isso e muito mais você vê no filme “Eduardo e Mônica”. Entre na fila para aprender que “Eu te odeio”, pode significar “Eu te amo”. Depende apenas da aventura que você aceitou viver.


Correspondente Internacional.